sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

JUROS DA DIVIDA DESÇEM ABAIXO DOS SEIS POR CENTO

Pela primeira vez desde final de outubro que os juros implícitos da dívida soberana não desciam abaixo dos 6%. O risco de default continua, também, em baixa em relação ao fecho de ontem.

As yields (taxas de remuneração da dívida que funcionam como juros implícitos no mercado secundário) para as Obrigações do Tesouro a 10 anos desceram, hoje, de manhã, abaixo do patamar dos 6%, pela primeira vez desde final de outubro, quando se começou a assistir ao disparo destes juros que chegaram acima dos 7% durante vários dias em novembro.

Os juros implícitos estão, de momento, nos 5,87%, segundo dados da Bloomberg, e a probabilidade de default (incumprimento da dívida) num horizonte até 2015 ronda os 31%, seis pontos percentuais abaixo do nível em que se encontrava no começo da semana, segundo dados do monitor da CMA DataVision.

O “bombeiro” de Frankfurt

Ainda que o risco não tenha subido, continua, no entanto, no patamar em que se fixou, ontem, depois das notícias de “alívio” vindas de Frankfurt de que o Banco Central Europeu (BCE) continuaria com os seus mecanismos extraordinários para financiar a banca europeia e para prosseguir, discretamente, no mercado secundário a aquisição de títulos de dívida soberana dos países mais aflitos da zona euro.

Segundo a agência Eurointelligence, à mesma hora em que o presidente do BCE falava aos jornalistas em Frankfurt, operadores no mercado secundário teriam colocado, em nome do sistema de bancos centrais europeus, grandes ordens de compra de dívida portuguesa e irlandesa na ordem dos €100 mil milhões de euros, um número gordo, superior ao total de compras feitas desde 9 de maio, que totalizaria os €67 mil milhões.

Fruto desse movimento de baixa, Portugal desceu do 5º lugar no TOP 10 mundial do risco de default, em que estava na segunda-feira, para 7º, a Irlanda desceu de 3º para 5º e a Espanha conseguiu sair hoje desse “clube”, onde andou durante a semana entre o 9º e o 10º lugar.

As yields no caso dos títulos a 10 anos desses dois países estão, também, a acompanhar a baixa. A Irlanda continua com juros abaixo dos 9% e a Espanha desceu do patamar dos 5%.

O índice iTraxx Europe Crossover – que dá uma ideia da “temperatura” da situação das empresas – para dívida a 10 anos baixou de 477,13 pontos base dia 1 de dezembro para 450,27 pontos base esta manhã. O que dá uma ideia do desanuviamento em curso.

Elevada incerteza no ouro e nas matérias-primas

No entretanto, parafraseando a expressão usada pelo BCE para caracterizar a economia no próximo ano, a “elevada incerteza” continua a fazer das suas. O ouro ontem quase alcançou, de novo, no valor de fecho, no mercado spot, os 1400 dólares por onça. Durante o dia ultrapassou esse patamar, mas acabou por fechar nos 1384,82 dólares. O anterior máximo de fecho, no mercado spot, está em 1409,48 dólares, atingido a 8 de novembro.

Além deste sintoma de desconfiança internacional sobre o andamento da economia mundial, o preço do barril de petróleo, da variedade Brent (que serve de referência na Europa), subiu acima dos 90 dólares, pela primeira vez desde a última semana de setembro de 2008.

No entanto, a inflação importada via disparo do preço das commodities não está a ser alimentada pelo crude (que em termos de variação anual até à data é ainda inferior a 1% no caso do Brent), mas por matérias-primas, como o algodão (que já subiu mais de 57%), pelo café (mais de 46%), pelo açúcar (mais de 26%), pelos cereais (mais de 25%), pelo cobre (cerca de 19%) e pela soja (quase 18%).

AS DECISÕES DO BCE (2 de dezembro)

Em conferência de imprensa, a partir de Frankfurt, Jean-Claude Trichet, o presidente do Banco Central Europeu, ladeado por Vitor Constâncio, vice-presidente, anunciou a manutenção da estratégia que tem sido seguida desde a crise da zona euro no princípio de maio.

O Conselho dos 22 governadores dos bancos centrais decidiu manter o consenso em três pontos capitais:
- não aumentar as taxas de juro diretoras; a taxa de juro aplicável às operações principais de refinanciamento mantém-se, desde maio de 2009, em 1% (claramente abaixo da previsão de inflação para 2010 que o BCE define numa banda entra 1,5% e 1,7%), a taxa de juro aplicável à facilidade permanente de cedência de liquidez permanece em 1,75% e a taxa de juro para a facilidade permanente de depósito continua em 0,25%;
- manter as suas operações de refinanciamento principais e especiais, até, pelo menos, 12 de Abril de 2011;
- prosseguir as suas operações de refinanciamento de longo prazo com datas para 26 de janeiro, 23 de fevereiro e 30 de março do próximo ano.

Estas medidas foram interpretadas como mantendo a boia de salvação para o sistema bancário europeu.
Sem entrar em detalhes, Trichet explicou, de viva voz, que o programa temporário de aquisição de dívida pública lançado em 9 de maio ao abrigo do Securities Markets Programme “segue o seu curso”. Desde aquela data, este programa já permitiu a aquisição de títulos de dívida soberana europeia num total de €67 mil milhões. Só na passada semana, teriam sido adquiridos 1,3 mil milhões, o dobro em relação a semanas anteriores. Este tipo de atuação mantém-se “discreto”.

Estranhas frases de prospectiva

Segundo o BCE o problema da inflação no médio-prazo continua “contido”, mas no campo macroeconómico mantém-se “uma incerteza elevada” e uma pressão negativa por duas vias: uma “relacionada com tensões em alguns segmentos dos mercados financeiros” com impacto em toda a economia da zona euro e outra através de inflação importada através do aumento dos preços de commodities (como o petróleo) ou do efeito de “pressões protecionistas e da possibilidade de uma correção desordenada dos desequilíbrios globais“.

O BCE insistiu, ainda, no prosseguimento pelos governos da zona euro em reformas estruturais, a par das estratégias de consolidação plurianuais. “Muitas reformas são particularmente necessárias naqueles países que sofreram uma perda de competitividade e que estão a sofrer de défices orçamentais e externos elevados”, prossegue a Nota Introdutória lida por Trichet, que aponta a necessidade de atuar sobre “a rigidez do mercado de trabalho” e de melhorar a competitividade do setor de serviços. Como cereja no topo do bolo, o BCE pretende que “todas estas reformas sejam suportadas por uma re-estruturação apropriada do setor bancário”.

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