terça-feira, 23 de abril de 2013

PARA O MINISTRO ALEMÃO DAS FINANÇAS, SCHAUBLE, NO PRÓXIMO RESGATE VÃO-NOS AOS DEPÓSITOS BANCÁRIOS...

“A participação de acionistas, detentores de títulos subordinados e, depois, depositantes sem garantia de depósitos vai passar a ser a norma quando uma instituição financeira cair numa situação difícil”, afirma Wolfgang Schauble, ministro das Finanças da chanceler Merkel, na edição de hoje (20 de abril) do semanário económico alemão “Wirtschaftswoche”. “Se não for assim, há um risco moral. Os bancos obteriam enormes benefícios em negócios de risco, mas, em caso de falência, as perdas seriam socializadas, ficariam a cargo de toda a sociedade – e isso não pode ser”, acrescenta.
Schauble é considerado, juntamente com o Fundo Monetário Internacional, como o artífice do “modelo cipriota” (template) de resgate no que respeita à reestruturação do sector bancário local, um resgate que, pela primeira vez, exigiu que os depositantes com depósitos acima de 100 mil euros vissem hair-cuts muito elevados aplicados com vista a contribuírem para a gestão da falência do banco Laiki e para a recapitalização e reestruturação do Banco de Chipre.
O ministro alemão veio repor na ordem do dia as declarações polémicas ao jornal “Financial Times” e à agência Reuters por parte do presidente do Eurogrupo, o ministro das Finanças holandês Jeroen Dijsselbloem, logo na madrugada (26 de março) da reunião do Eurogrupo que aprovou o modelo final de resgate de Chipre. “Quanto ao substancial, Dijsselbloem foi criticado de forma injusta. Mas não por mim”, diz Schauble, distanciando-se do coro de críticas à ideia transmitida pelo holandês de que a solução para Chipre passaria a ser o “modelo”. Um dia depois, o holandês veio dar o dito por não dito, repetindo que se trataria de uma solução “única”. Mas, agora, o poderoso ministro das Finanças de Merkel voltou a colocar o “modelo” nas linhas.
No entanto, no final de março (dia 30), o ministro das Finanças alemão teria dado a entender o contrário. Segundo o jornal “Cyprus Mail”, Schauble teria reafirmado em entrevista ao jornal alemão “Bild” que Chipre era mesmo “um caso especial”, distanciando-se de Dijsselbloem. “Chipre é e continuará a ser um caso único especial. Os depositantes na Europa estão seguros”.
Nem mais um euro para Chipre
Schauble, na mesma entrevista dada hoje a Christian Ramthun e Henning Krumrey, afirma que a Alemanha não autorizará nem mais um euro para Chipre além do empréstimo europeu (€9 mil milhões) e do FMI (mil milhões de euros) num total de 10 mil milhões de euros. Aliás, o semanário alemão puxou esta afirmação para título. Mais do que 10 mil milhões de empréstimo “põe em causa a sustentabilidade da dívida de Chipre”.
Ora, recentemente, novos cálculos sobre as necessidades de financiamento de Chipre até ao primeiro trimestre de 2016, para evitar a bancarrota, apontam para 23 mil milhões de euros, seis mil milhões a mais do que as contas inicias que apontavam para um pacote global de 17 mil milhões, em que sete mil milhões teriam de ser arranjados pelo governo de Chipre para resolver a reestruturação do sector bancário e outro apsectos. Mas Schauble diz que “tais números (23 mil milhões) nunca foram oficiais. Eles foram baseados em suposições preliminares, não oficiais”.
De um momento para o outro surgem 13 mil milhões para o governo arranjar (e não só os 7 mil milhões iniciais). Entretanto, o “Financial Times” aponta para um total mais baixo, de 20,6 mil milhões de euros. Para além do confisco nos depositantes (com depósitos acima de 100 mil euros) discutiu-se também a possibilidade de venda de parte das reservas de ouro do Banco Central de Chipre. Uma avaliação da sustentabilidade da dívida de Chipre realizada pela Comissão Europeia revelou a 9 de abril que Nicósia ter-se-ia comprometido a vender cerca de 400 milhões de euros de reservas de ouro “em excesso” no conjunto de 13,9 toneladas que o Banco Central dispõe. O Banco central desmentiu que estivesse a considerar tal venda. O impacto deste rumor no mercado do ouro, associado à ideia de que as vendas de ouro possam passar também a fazer parte do novo “modelo” de resgates no futuro, foi avassalador, com uma quebra do preço da onça de cerca de 160 dólares entre 14 e 16 de abril.
Parlamento cipriota votará MoU provavelmente a 26 de abril
As declarações de Schauble vêm na sequência da aprovação do plano de resgate de Chipre por 487 votos em 602 deputados, na quinta-feira, no Bundestag, Câmara Baixa do parlamento alemão. Ocorreu na mesma sessão parlamentar em que foi aprovada a extensão de maturidades dos empréstimos dos fundos europeus a Portugal e Irlanda no âmbito dos planos de resgate em curso. Por outro lado, o governo finlandês sobreviveu a um voto de confiança colocado pelo partido populista dos Verdadeiros Finlandeses que punha em questão o resgate a Chipre.
Entretanto, em Chipre o Memorando de Entendimento (MoU) com a troika será votado na próxima semana, provavelmente dia 26, depois do procurador-geral ter decidido que a votação era uma obrigação constitucional. Na quinta-feira passada, os deputados cipriotas aprovaram alguma da legislação necessária para o resgate, mas deixaram de fora alguns diplomas importantes.
Teme-se que, na próxima semana, possa não haver uma maioria de aprovação do MoU, o que requer 29 votos em 56 lugares. A Aliança Democrática (DiSi), o partido do presidente Anastasiades, e o Partido Democrático (DiKo), que suporta o governo, dispõem de 28 votos. Um ex-deputado do Partido Democrático é agora independente e desconhece-se o seu sentido de voto. Os comunistas (AKEL, que perderam a 2ª volta das eleições presidenciais), os socialistas e sociais-democratas (EDEK) e o Movimento dos Verdes (KOP) declararam oposição ao plano de resgate e especula-se que poderão votar contra contando com 25 votos, ainda que o governo do presidente Anastasiades acredite que se absterão.

SEGUNDO RESGATE DE PORTUGAL JÁ A CAMINHO....

MUNCHAU: Portugal will require a new programme, and there will ultimately be a significant degree of debt default, negotiated or otherwise
Wolfgang Munchau, German, 51, based in Oxford UK, founder of Eurointelligence and editor and columnist of the Financial Times, in an interview at Expresso weekly newspaper in Portugal, interviewed by Jorge Nascimento Rodrigues, 20 April 2013.
Main Topics
# «If you extend maturities for sufficiently long enough, and reduce interest rates towards zero, then forbearance turns into debt foregiveness. A seven-year extension is, however, not going to be sufficient. Portugal will require a new programme, and there will ultimately be a significant degree of debt default, negotiated or otherwise.»
# «I expect a new full programme, and that would not be consistent with the OMT. If I am wrong, I would expect a combination of precautionary credit line and OMT. »
# «Austerity continues in Europe, but I expect the extend to lessen a bit. What concerns me a lot more than the isolated austerity in the south – which is to some extent necessary, is the austerity in the north, which is not. The eurozone as a whole needs an expansionary policy, made of a strong element of fiscal expansion in the north, and moderate austerity in the south.»
# «I am getting more sceptical about the long-term sustainability of the eurozone. I see no chance that we will be overcoming the various debt and adjustment crises with the current crisis resolution framework. We will see a lot more default in the private and public sector, against external debtors, but also government default against their citizens, and I am not sure the latter is politically sustainable. As for the supposedly “genuine economic and monetary union”, I just don’t see it. The banking union will stop half-way. There will be a joint resolution fund, no joint deposit insurance.»
# «I think monetary financing of debt is not only illegal, but also very detrimental in the long run. The only thing that can overcome the crisis is a joint economic policy, where the most important econoimc policy decisions are centralised, where in turn, the burden of some of the existing debt stocks is shared. Plus a framework to manage default in the banking sector, and to manage sovereign default.»

quinta-feira, 4 de abril de 2013

É PRECISO ACABAR COM OS PARAÍSOS FISCAIS.

Os paraísos fiscais matam as nossas democracias

4 abril 2013
Le Monde Paris

Ruben L. Oppenheimer
Um grande estudo sobre titulares de contas “offshore” levado a cabo por vários jornais, incluindo “Le Monde”, revela a extensão internacional do fenómeno. Deve ser encarado como um sinal de alarme para a sobrevivência dos nossos sistemas políticos, considera a diretora do diário francês.
O que tivemos de ouvir, na sequência da convulsão financeira mundial de 2007-2008! As palavras de ordem sucediam-se: a finança internacional ia ter melhor regulamentação, os paraísos fiscais iam ser impiedosamente combatidos, acabava-se com os buracos negros de um sistema que dá cobertura a todos os abusos. As conclusões de uma reunião do G20 realizada em Londres surgiam como um poço de virtudes.
Os Estados desse círculo da elite mundial prometiam “medidas contra os paraísos fiscais”, arvorando a ameaça de sanções e garantindo, alto e bom som, que “a era do sigilo bancário [tinha] terminado”. Após a crise que agora abalou o Chipre, praça “offshore” privilegiada pelos oligarcas russos e outros amantes da opacidade na gestão dos seus negócios, eis-nos, em França, apanhados pelo turbilhão do caso Cahuzac, um escândalo estatal que põe em causa a integridade e transparência mais elementares, exigíveis a qualquer político, muito mais quando guindado a cargos de alta responsabilidade.

Rede tentacular

As notícias encadeiam-se, por vezes, a um ritmo vertiginoso. Para que fique claro: a investigação que Le Monde começa hoje a publicar em parceria com The Guardian, Süddeutsche Zeitung, Le Soir e Washington Post, dedicada ao mundo subterrâneo dos paraísos fiscais à escala mundial, ao seu funcionamento oculto e beneficiários de todas as esferas, não foi motivada pelos tumultos de Nicósia nem pelas trapalhices do [antigo ministro do Orçamento francês] Jérôme Cahuzac.
A investigação foi iniciada há vários meses. Baseia-se no acesso sem precedentes de um consórcio internacional de jornalistas de investigação a uma gigantesca base de dados, que revela o funcionamento subterrâneo do mundo dos “offshores”. São 2,5 milhões de ficheiros, que foram passados a pente fino, comparados e cruzados. O resultado é a exposição de uma rede tentacular da finança clandestina. Nesta massa de documentos, são mencionados dois bancos franceses. Bem como o ex-tesoureiro de campanha de François Hollande em 2012, Jean-Jacques Augier – que garante nada ter feito de ilegal ao recorrer a um parceiro chinês, através de intervenções “offshore”.

PIB conjunto dos EUA e do Japão

A exposição de casos individuais, por mais aliciantes que sejam, não deve desviar a atenção da questão de fundo: os paraísos fiscais são uma ameaça para a democracia. Minam o Estado de Direito, apostando na ocultação. São um maná para os defraudadores de todos os quadrantes. Promovem o desvio de recursos públicos, em Estados onde imperam o suborno e a corrupção. Neste mundo de uma criatividade jurídica que parece ilimitada, escondem-se valores colossais por trás de empresas de fachada. Personalidades endinheiradas mantêm aí o equivalente ao PIB conjunto dos Estados Unidos e do Japão.
Agora que este estudo vem a lume, ninguém poderá continuar a fingir que acredita que os dirigentes políticos, apesar do que afirmam, não tenham verdadeiros meios de atuação. É urgente reforçar a regulamentação, os meios de controlo, a cooperação transfronteiriça. A luta contra a lavagem de capitais passa por aí. E os bancos ocidentais amantes de esquemas obscuros dificilmente poderão poupar-se a uma resposta clara. Pelo menos, se quiserem que, em tempo de crise, seja dado crédito às suas profissões de fé sobre “ética”.