sexta-feira, 5 de novembro de 2010

PORQUE É QUE OS JUROS DA DÍVIDA AINDA VÃO SUBIR E VAMOS TER DE PEDIR AUXÍLIO AO FUDO EUROPEU - por moral hazard - ou seja os nossos credores só agora ficaram assustados com a real hiótese de perderem tudo!

Os investidores internacionais na dívida soberana caíram, finalmente, na realidade, depois da decisão do Conselho Europeu do final do mês passado em caminhar no sentido de instituir um sistema de gestão de crise “em que os investidores serão forçados a ter de assumir uma maior fatia de prejuízos em resgates futuros de países”.

Eis uma “causa comum para o disparo sincronizado“ das yields (taxas de remuneração) relativas à dívida pública no trio de países em crise – Grécia, Irlanda e Portugal – e da probabilidade de default que tem estado em destaque nesta semana negra, refere-nos em entrevista Cinzia Alcidi, investigadora do Center for European Policy Studies (CEPS), um dos mais conceituados think tank europeus, sedeado em Bruxelas.

P: O que está a encostar à parede a Irlanda com juros da dívida pública muito acima de 7% e uma probabilidade de default que a empurrou, surpreendentemente, para perto da Venezuela e da Grécia no ranking mundial desse risco?

R: A Irlanda é uma pequena economia com bancos muito grandes. Mesmo tentar salvar um único banco implica um esforço enorme num governo cuja capacidade de obter impostos – e eventualmente pagar a sua dívida soberana – emagreceu significativamente com o estoiro da bolha imobiliária e com o recuo das entradas de capital no país. O problema fundamental por detrás da situação crítica irlandesa é o estado do seu sistema bancário.

Um final de jogo idêntico

P: Mas o governo em Dublin conseguirá dar a volta ao problema?

R: Os números de facto, de momento, são enormes, Mas penso que a dívida ainda pode ser sustentável. No entanto, desempenharão um papel crucial o comportamento do prémio de risco e saber se os investidores domésticos serão atraídos pelos títulos do governo.

P: A discussão em Dezembro do orçamento irlandês para 2011 e a turbulência que já se está a gerar em seu torno, com o risco inclusive de eleições legislativas antecipadas no horizonte, são um sinal de que se aproxima o ponto de viragem em que Dublin terá de ir bater à porta de Bruxelas? O Tigre Celta é a próxima Grécia?

R: As raízes dos problemas na Irlanda e na Grécia são distintas, mas o final do jogo, confesso, pode ser igual. A Irlanda adiou o seu refinanciamento na esperança de que as condições melhorassem. Mas isso pode vir a revelar-se uma previsão muito optimista. Não se pode excluir que a Irlanda tenha de vir a pedir o apoio da Facilidade Europeia de Estabilização Financeira (EFSF, na sigla em inglês). Mas, ao fim e ao cabo, foi esse precisamente o propósito para que tal facilidade foi criada.

Um dueto impossível na Grécia

P: E como é que foi possível que a Grécia tenha visto a sua imagem deteriorar-se ao ponto de “ultrapassar” em probabilidade de default a Venezuela ou a Argentina, mesmo com a intervenção do Fundo Monetário Internacional (FMI) e de Bruxelas? Como foi possível que tenha chegado a número um do risco?

R: O propósito do pacote de salvação da Grécia por parte do FMI e da União Europeia é permitir a Atenas ganhar tempo para poder melhorar as suas condições, sem ter à perna a pressão dos mercados. Mas, é claro, que o plano, só por si, não garante que o país consegue reverter a situação no sentido de um caminho sustentável. Isso só acontece se houver uma mudança nas condições fundamentais do país. Isso ainda não aconteceu.

P: E vai acontecer num horizonte próximo que dê confiança aos investidores?

R: A Grécia precisaria de fazer um ajustamento, muito doloroso, do tipo do que a Lituânia fez. Mas isto parece-me improvável e as condições de partida no caso grego – dívida elevada, baixa competitividade, baixa credibilidade – são muito desfavoráveis. Acrescente-se que as condições económicas globais são adversas. O que não torna a missão nada fácil. Pelo contrário, contribuem para tornar a consolidação orçamental e o crescimento económico um dueto impossível. Resultado: o risco de default aumenta, apesar do plano de salvação.

A causa comum da sincronia actual

P: O que é que está por detrás da sincronia actual a que estamos a assistir no agravamento dos juros da dívida pública e no risco de default dos três países mais frágeis da zona euro, Portugal, Irlanda e Grécia?

R: No caso da Grécia penso que a divulgação de novos números, rectificando anteriores, desempenhou um papel importante nesse disparo. Contudo, globalmente, julgo que é claro que a causa comum desse disparo sincronizado foi a decisão a nível europeu sobre um futuro mecanismo permanente de resolução de crises em que se passe a um enquadramento de gestão de crise da dívida em que os investidores serão forçados a assumir uma fatia maior de prejuízos em futuros resgates de países. Esta reacção era esperada e foi explicitamente antecipada por Trichet, o presidente do Banco Central Europeu, depois do Conselho Europeu de final do mês passado.

P: Mas os investidores internacionais não deveriam estar preparados para isso?

R: Admito que a lógica por detrás da reacção dos investidores seja clara e até faça sentido economicamente, mas acho-a, pessoalmente, muito desapontadora.

P: Desapontadora, por quê?

R: Havia um certo consenso nos mercados financeiros que alguns países da zona euro poderiam eventualmente vir a necessitar de re-estruturações das suas dívidas – isto era o que muitas análises realizadas por bancos e até muitos investidores vinham clamando há vários meses. Ora, quando a re-estruturação das dívidas soberanas se torna uma possibilidade concreta, os mesmos parecem chocados.

P: Qual a razão desse choque?

R: A minha leitura é que, implicitamente, esses investidores julgavam que seriam os contribuintes da zona euro, algures na zona euro, que estariam de braços abertos para pagar por alguma dívida “insegura” para evitar que os prejuízos no setor privado se materializem. Ora isto é exactamente o que os americanos chamam de moral hazard, um incentivo moral para agir erradamente, e definitivamente isto é algo que é necessário erradicar.

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