domingo, 21 de novembro de 2010

ENTRE ÁGUIAS REAIS E ABUTRES

1-Ao longo da minha vida profissional fui sempre tendo tempo para variadas actividades cívicas, a primeira das quais a política em sentido lacto.
Foi assim que em finais da última década do século passado ( 1998 ? 1996 ? ) tive oportunidade de conhecer duas das personagens que estiveram sempre presentes na primeira linha das (in)decisões que nos levaram aonde estamos agora: o eng. João Cravinho actualmente administrador colocado pelo Estado português no BEI ( Banco Europeu dde Investimentos ) , e de Ferraz da Costa o "patrãodos patrões ". Ambos sempre próximos da(s) mesa(s) do(s) Orçamento(s), o primeiro famoso por ao deixar a pasta das obras públicas declarar (cito de lembrança ) que a obra ( à base de parcerias público-privadas ) que deixava iriam lustrar o ministro que o substituisse; e o segundo deixando alimentar sonhos de grandeza tais como o de ser secretário -geral do então CDS ou eventual primeiro - ministro.

2-Almoçei com eles no Meridian do Porto, à Boavista, e, ouvi a conversa que os dois travaram. Discutiam os efeitos para Portugal ( ambos diziam "este país " ) com a entrada anunciada dos países de leste na união europeia.
Para resumir , e espremida a retórica venal e de unhas sujas ( literalmente ) de um Cravinho seborreico na cutis e nas ideias, e a de uma vaidade vácua e energicamente petulante do pequeno homem da CIP, esprmido tudo o que dissereram à minha frente  foi isto: Portugal ( "este país" ) estava feito ao bife quando os de leste entrassem na união com os seus baixos preços de mão-de-obra, com a qualificação superior que ela tinha e com os hábitos de trabalho árduo e de horário flexível próprio de gente habituada no comunismo. E diziam, e previam, seguramente, sem margem para dúvidas, que , "este país" se iria afundar em poucos anos: um deles apostava (não recordo qual ), apostava em seis anos, o outro , mais pessimista, em quatro!
Para meu espanto, nenhum deles referiu o peso da China que , tudo apontava, entraria na OMC Organização Mundial do Comércio) em 2000 ou por aí ! A conversa entre dois dos mais conhecedores políticos de Portugal ( um de direita, outro de esquerda), ficava-se por clichés pensados por muita gente e por um arrazoado de lugares comuns que podiam ouvir-se à noite no Café Piolho entre universitários caloiros. Nenhuma ideia, nenhuma preocupação genuína, nenhum sentido de anúncio público do problema - como se isso lhes não competisse - nenhum sentimento , mesmo que vago, de mudar a situação : apenas uma constatação ignorante da China , e um discurso de quem lê o Diário de Notícias na diagonal e desconhece, mesmo de nome , o Le Monde Diplomatique, muito mais o The Economist !
À noite, na conferência para que vinham à província e ao Norte a expensas do Forum Portucalense a cuja direcção eu pertencia, a mesma displicência calma e afagada, a mesma anestesia do verbo que carreava nos ouvintes uma total analgesia : o dinheiro de Bruxelas no dia seguinte ia continuar a chegar. E a chegar bastava para dar descanso aos seus neurónios. E o público satisfeito, meio dormente com a dolência dos palestrantes!...

3- Eu assisti a isto tudo . Assisti com uns duzentos e vinte wolts a percorrerem-me a alma desidratada de todo!

4-Recordo que nessa noite , e em muitas outras pensei com os meus botões ( e bastas vezes comentei para quem tinha a pachorra de me ouvir ) que estas duas luminárias do regime não passavam  de formigas à beira de ex-ministros de Salazar com quem eu privara de muito perto a seguir ao 25 de Abril:  os embaixadores Henrique Martins de Carvalho (ministro da saúde) e Franco Nogueira ( dos Estrangeiros ) ambos nas férias que todos fazíamos em Cinfães nos meses de Setembro, e o professor Silva cunha ( da Defesa e do Ultramar ) nos três dias semanais que durante anos o trouxeram a dar aulas numa universidade do Porto permanecendo num hotel da cidade onde eu ia todos os dias e passavamos horas a conversar. Da forma de falar, da elegância contida da educação mas, sobretudo, da craveira intelectual e da visão histórica e estratégica das coisas que interessavam à Pátria...era como do vinho para a água.

5-Até que ontem vi escrito num jornal uma muito parva (porque de sibilina insinuação ) declaração de Cravinho (espero que agora de unhas limpas ) sobre as culpas de altas personalidades na pré-bancarrota em que estamos. Então porque é que não ouvi na conferência, nem em declarações públicas, nenhum aviso de tão avisadas criaturas, de tão doutos crâneos ?
Seguramente, mistério.

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