quarta-feira, 1 de julho de 2009

OS 5 PECADOS MORTAIS DA CONDIÇÃO LUSA. 5: A FALTA DE EMPATIA

Se a emulação presente na inveja e a intolerância presente nas definições a que se agarram os néscios para se sentirem definitivos, têm ambos a vêr com a consciência da modernidade, há um outro pecado mortal da actual civilização: a ausência ou definhamento da empatia.
A empatia era uma dimensão quase paradigmática da, e na, consciência romântica. Foi definhando com a consciência moderna. Por isso, as relações entre sujeitos tornaram-se mais epidérmicas, mais distantes e menos regulares. Em contrapartida, à medida que minguava a empatia, crescia a dimensão ajuizativa, o que foi provavelmente inevitável porque só julga quem não é capaz de compreender empaticamente. Mas também, porque julgar pressupõe a existênciaa da verdade consagrada. E do reino da Razão.
Mas afinal em que consiste a empatia?
Há muitos, muitos anos, Avicena, o famoso médico árabe, foi chamado pelos amigos de um príncipe doente : queriam que o curasse. Diziam-lhe que após consultas a todos os outros médicos, Avicena era a última esperança.
Avicena perguntou pelos sintomas do príncipe. Os amigos explicaram que o doente teimava em declarar que se tinha transformado numa vaca e exigia ser abatido.
Quando Avicena chegou ao principado verificou que já todas as pílulas, purgantes, ventosas e sangrias haviam sido ensaiados, mas o príncipe insistia que era uma vaca e exigia ser abatido.
Avicena entrou no palácio e tentou primeiro saber tanto quanto possível sobre o príncipe ouvindo todos. E naquele país havia tantos que gostavam de falar!!!.... Depois tentou compreender o príncipe escutando-o : mas como ele não dizia mais que "mmmuuuu", isso nada adiantou no que respeita ao comportamento suicidário do príncipe.
Finalmente disse-lhe:-" Sim, sim, agora compreendo que és uma vaca e deves ser abatido. Mas estás tão magro...que antes vai ser necessário engordar-te um pouco! ". Ouvindo isto, o príncipe aceitou comer, coisa que não fazia há muitos dias, e então, lentamente,....o final é óbvio!.
Se Avicena se tivesse identificado com o príncipe, teria sido talvez simpático, mas haveria duas vacas exigindo ser abatidas. Se tivesse antipatizado, o príncipe negar-lhe-ia a sua confiança. Com a empatia, conseguiu ajudar.
Assim a empatia é sentir com o outro, é sentir como ele sente.
Ora, pode não haver qualquer lógica ou razão no modo como alguém (se) sente..Daí também que que a empatia nunca pudesse ser a atitude dominante da consciência moderna ( que previligia a Razão ). Já o era, porém na consciência romântica ( que prviligia a Paixão ) : que mais estrita empatia pode existir para além do mais caloroso enamoramento?
Por isso, uma sociedade mordida pela modernidade tende a ser uma sociedade em que a intimidade e o seu direito estão constantemente a ser agredidos.
Todos são na modernidade, simultâneamente juízes e arguídos uns dos outros. De forma mais ou menos subtil. Mas juízes. Uma mulher encontra uma velha amiga que já não vê há muito tempo e atira-lhe: -"Ah!...nem te reconhecia, eras tão magra!". O que pode ser entendido como:-"Ah!..., como estás deselegantemente gorda!". O que significa que quem ajuíza tem por si uma espécie de Código Civil dos Pesos Ideais. Mas podia ser a mesma mulher a ouvir a mesma exclamação da boca da outra. Ambas vivem na consciência da modernidade e ambas julgam e acham natural ser julgadas.
Competir e ter sucesso, eficácia e estar na moda e sobretudo aparentar tudo isto, são noções que à modernidade importam e que arrastam consigo a necessidade permanente de medir.
Mas quem compreende não mede.
Não se pode pesar ou medir a insustentável leveza e a incomensurável infinitude do ser.
Ora, ao Poder interessa o o juízo e não a compreensão ou a empatia.
Se empatizasse, o Poder não poderia julgar. E se não julgasse, como poderia exercer o poder?
Podemos questionar-mo-nos se há poder sem julgar. Aparentemente, não.
Mas a questão é muito mais outra: não será que menos atitudes ajuizativas do Poder produzem cidadões mais compreensivos, e por essa via mais tolerantes? Com-vivendo melhor?
Parece pois que na nossa sociedade há empatia a menos e intolerância a mais.
Estas características não se cingem aquelas duas amigas donas-de-casa acima descritas. Não. Elas tudo invadem. Da educação aos espaços lúdicos. Do modo como os políticos são, à organização dos partidos. Da moralidade comum à organização do trabalho e à economia. Tudo impregnam desde o berço.
O que pode fazer crer que é um fado. Mas não é.

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