sábado, 23 de maio de 2009

CULTURA BIBLOT

Henri Michaux dizia que o grande problema dos reis fraceses era nunca tocarem nos puxadores das portas - este prazer estava-lhes vedado .


Lili descobriu aos 37 anos que a sua vida era um erro : nunca tinha feito uma cama nem estrelado um ovo. Daí que tivesse tomado a decisão de começar uma nova vida Um corte terrível mas não inteiramente conseguido, como se vê pela espantosa entrevista com Isabel Coutinho na "Pública".


Porque o desconcertante é que Lili Caneças ( que apesar de tudo ouviu falar em Frank Loyd Wright, Le Courbusier ou Fank Gehry dentre outros, consegue manter hoje um discurso que parece ser a caricatura de si mesmo. Daí que o leitor oscile sempre entre achá-lo patético ou hilariante. Mas podemos fazer disto melhor uso : ele é o mais deslumbrante exemplo de insensibilidade cultural e social de parte da nossa burguesia que vive nas referências analfabeticamente vistosas de uma cultura biblot. Mas de um ponto de vista sociológico trata-se de um material precioso.


Lily casou-se com um homem que vivia na Quinta da Marinha. Viu um filme de James Bond e desejou ir à Jamaica. No dia seguinte a viagem estava marcada. O generoso marido não se poupava a esforços: ofereceu-lhe um Jaguar Type E 4.2 como só havia um outro em Portugal. A lua-de-mel deixou-lhe uma inesquecível recordação: foi no Palace de Saint-Maurice.


"Procurar educar bem os filhos porque o dinheiro vem e vai, e de um dia para o outro pode acontecer uma revolução. O Paulo Portas explica isto - como explica o que para ela é politicamente importante (incluindo a miséria no mundo). Quando se separou do marido, já é azar, acrescentou ao escândalo apaixonar-se por um "hippie". Não era um "hippie" qualquer, dava conferências sobre os mercados financeiros aos nossos ministros e trabalhava em Wall Street. Mas era um "hippie". E por isso, ( ainda não havia o Paulo Coelho), Lily Caneças passou doze anos a vêr o seu interior, num movimento carismático de oração voltado para as coisas espirituais. Isso ajudou-a a suportar as futuras dificuldades económicas. E porquê? Porque " hoje em dia, os juros estão baixíssimos e é muito difícil viver dos juros". O desespero era tal que, à data da entrevista, Lily Caneças estava mesmo a pensar em trabalhar. Felizmente arranjou um emprego modesto mas útil e bem remunerado: apresentadora do Bar da TV, onde classificou a Margarida como a Joana D'Arc de Borba.

Como dizia Prado Coelho, ninguém inventa um discurso assim: só Lily Caneças o pode fazer com autenticidade. E acrescentar como Alberto Caeiro:" O meu segredo é não ter segredo nenhum". Dava para adivinhar.

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