terça-feira, 19 de maio de 2009

A ESPUMA DOS DIAS

Ontem o meu dia correu pesado.

De manhã telefonou-me o meu melhor amigo para, a chorar, me contar que o seu sócio de riquezas, negócios, trabalhos e cruzeiros estava a morrer com um cancro do pulmão. " Já está nos cuidados intensivos e eu, Zé, não estou preparado para a morte dele! Julgava que estava, nas não!". Por isso andava a passear pelas dunas de S. Pedro de Moel incapaz de sofrer dentro da clausura das suas várias fábricas. Por isso, sem nenhuma vontade de voltar a casa, telefonou ao outro amigo que eu sou, numa espécie de vasos comunicantes de afectos que vivem muito da vicariância compensatória. Tirando eu, mais ninguém terá sabido do "apagão" que ele ontem viveu. Não falou à mulher, aos filhos ou, sequer, à mãe ainda viva e lúcida: procurou o melhor amigo, aquele único que o podia ouvir chorar sem ele sentir vergonha, porque para ele como para mim " um homem não chora", era o que diziam as nossas mães!

E procurou quem ele acha que o pode compreeender melhor ( que nestas situações de absolutos ), sentimos sempre como sendo a única pessoa possível: o melhor amigo.

É a pura exaltação do romantismo ( coisa de que as mulheres são muito geralmente incapazes porque o confundem com o puro lirismo) esta compaixão ( com a paixão= com o sofrimento ) do meu melhor amigo e que tem qualquer coisa de indefenivelmente épico.

E como sempre acontece nos actos apaixonados, perdia a ordem do que sentia mas ganhava a lucidez da razão. Não o disse assim, mas queria dizer que a vida não vale nada mas não há nada que valha a vida.

E à noite nos Prós e Contras, no canal 1, na televisão o professor Adriano Moreira foi expicando o que é e não é essencial na nossa vida. E, da mesma maneira que no seu livro de memórias " A Memória do Tempo" fugiu às questiúnculas das politiquices para se debruçar sobre as constantes da História, recusou falar mais sobre Freeports ou outros fait-divers para se debruçar sobre o que há nos portugueses que, regularmente na nossa história, fomenta esses casos.

Tal como o meu amigo, optou por dedicar o seu tempo àquilo que é o sal que amarga a espuma dos nossos dias sem se preocupar com a espuma.

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