sexta-feira, 12 de junho de 2009

O QUE OS JORNAIS PORTUGUESES NUNCA PUBLICARIAM I

O jornal THE VANCOUVER SUN, publicou em 18/04/2009, assinado por Peter Mcknight, o seguinte texto que faço questão de publicar aqui, na perspectiva editorial de este ser um blogue de crítica social e elevação pátria:

"DESPENALIZAÇÃO DO CONSUMO É UM EXEMPLO"


tanto o consumo em geral como as doenças ligadas ao uso de drogas diminuiram desde que a lei portuguesa foi suavisada.


À medida que o México vai sendo esmagado, de forma cada vez mais rápida e visível, pela guerra contra a droga, políticos do México e dos Estados Unidos da América têm ousado sugerir que a despenalização é a melhor resposta. Segundo eses políticos, a despenalização permitiria aos Governos desviaR a sua atenção da redução da oferta para a redução da procura e redireccionar para o tratamento fundos agora utilizados para fazer cumprir a lei. O resultado final, argumentam, seria uma redução dos danos provocados pelo consumo da droga.


Os defensores da penalização argumentam que o efeito seria o oposto. A despenalização transmitiria a mensagem de que o consumo de drogas é aceitável, afirmam, levando a um aumento do consumo e dos danos associados à droga.

O problema com estas discussões, já ouvidas milhões de vezes, é que ocorrem num vazio empírico. Dada a falta de provas empíricas, resta-nos especular sobre os efeitos da despenalização e, uma vez que poderia conduzir a maiores danos, muitas pessoas estão convencidas de que é melhor deixar como está aquilo que já é suficientemente mau.


O problema é que há provas empíricas. Embora pareça ser o segredo mais bem guardado do mundo, Portugal despenalizou formalmente a posse de todas as drogas ilícitas, já em 2001. E a sua experiência proporcionou em maná de provas empíricas sobre os efeitos positivos da despenalização.


Segundo Glenn Greenwald, especialista norte-americano em Direito Constitucional, que elaborou um relatório sobre a política portuguesa sobre drogas para o Instituto Cato, sediado em Washington, a despenalização levou a uma redução das patologias relacionadas com as drogas, exatamente como previam os defensores deste tipo de medidas, e a uma diminuição do consumo, exatamente o oposto daquilo que os opositores receavam.

Tendo passado por graves problemas de droga nos anos de 1990, Portugal criou uma Comissão para a Estratégia Nacional da Luta contra a Droga, que publicou, em 1998, um relatório que destacava que a penalização desviava recursos do tratamento e desencorajava as pessoas de procurar ajuda para curar a dependência. Por conseguinte, esta Comissão recomendava a despenalização para reduzir tanto o consumo como o abuso de drogas ilícitas.


Em 2000, o Conselho de Ministros aprovou uma política coerente com aquele relatório e, a 1 de Julho de 2001, entrou em vigor uma nova lei que despenalizou a posse, para uso pessoal, de todas as substâncias narcóticas e psicotrópicas, incluindo a heroína e a cocaína. O tráfico continua a ser considerado crime.

A posse é, agora, considerada uma infracção «administrativa», o que significa que a polícia pode elaborar autos de ocorrência, mas não deter as pessoas apanhadas com droga. Os indivíduos que forem alvos de um auto de ocorrência devem comparecer perante uma comissão de três pessoas, que pode decretar um leque de sanções, incluindo multas e ordens de tratamento, embora, na grande maioria dos casos (83 por cento), as comissões tenham decidido suspender os processos.

Para avaliar os efeitos desta política, Greenwald começa por comparar estatísticas portuguesas anteriores e posteriores à despenalização, e conclui que «em quase todas as categorias de drogas, e no que se refere ao consumo global, as taxas de prevalência ao longo da vida na época anterior à despenalização, nos anos de 1990, eram superiores às taxas do período posterior à despenalização».

Esta redução de taxa de prevalência ao longo da vida - a medida da percentagem de pessoas que consumiram uma droga pelo menos uma vez na vida - foi estudada em diversas faixas etárias, incluindo o grupo crítico dos 15 - 19 anos, durante o qual a maioria das pessoas experimenta drogas pela primeira vez.


Os receios de que a despenalização leve a um aumento do consumo de drogas parecem ser infundados, pelo menos em Portugal. Porém, um criminologista da Universidade de Maryland, Peter Reuter, embora admitindo que «a despenalização atingiu, de facto, o seu objectivo principal, em Portugal», sugere que a mudança da lei portuguesa ocorreu durante um período de deminuição global do consumo de marijuana.

É importante, por isso, comparar não só as taxas de consumo em Portugal ao longo do tempo, mas também comparar a experiência portuguesa com a de outros países. Foi o que Greenwald fez e o Portugal da pós-despenalização parece ser um modelo para toda a União Europeia.

Entre 2001 e 2005, Portugal teve a mais baixa taxa de prevalência ao longa da vida para a marijuana, a droga ilícita mais popular na UE, onde muitos países têm taxas duas e três vezes superiores à portuguesa. O mesmo se verificou com a cocaína, a segunda droga mais popular: a taxa de prevalência ao longo da vida era a sexta mais baixa da UE e muitos países-membros apresentavam, mais uma vez, taxas duas, três e quatro vezes superiores à de Portugal.

Na faixa etátia crítica dos estudantes universitários, a taxa de prevalência ao longo da vida para a cocaína em Portugal é de apenas 1,6 por cento, comparada com quatro por cento na maior parte da Europa, o que sugere que aquele país continuará a ter muito menos problemas no futuro. Resultados semelhantes foram registados relativamente a outras drogas problemáticas, entre as quais a heroína e as anfetaminas.

Neste momento, as taxas de consumo de drogas em Portugal também são muito inferiores às da maioria dos países não pertencentes à UE, incluindo o Canadá e, em especial, os Estados Unidos, cujas taxas de consumo de cocaína e canábis, são tão elevadas - as mais altas do mundo, apesar da sua furiosa guerra contra a droga - que são consideradas anomalias estatísticas.

E, temos dito, no que se refere ao primeiro argumento contra a despenalização: que esta conduzirá ao aumento do consumo. Mas o que dizer acerca do primeiro argumento a favor da despenalização: que irá reduzir as patologias relacionadas com o uso de drogas?

Glenn Greenwald salienta que a despenalização teve como consequência um aumento dos financiamentos para programas de tratamento, o que deu origem a mais camas para desintoxicação, comunidades terapêuticas e casas de acolhimento temporário. Os consumidores também deram mostras de uma vontade renovada de recorrer a estes programas. O número de pessoas que aderiram a programas de substituição de drogas aumentou 147 por cento, passando de 6040 para 14 877 entre 1999 e 2003.

Poder-se-ia esperar que estes factos tivessem um efeito assinalável sobre a morbilidade e a mortalidade, e assim foi. Portugal tinha, em 1999, a taxa mais elevada de VIH/sida da UE entre os consumidores de drogas injectáveis, mas, a cada ano que passou desde 2001, o número de novos casos diminuíu substancialmente. Houve ainda uma diminuição modesta das infecções por hepatite B e C.

Quanto à mortalidade, entre 1989 e 1999, Portugal registou todos os anos um aumento das mortes por doença aguda associadas às drogas, com perto de 400 mortos nesse ano. Depois da despenalização, esta tendência inverteu-se: em 2006 morreram 290 pessoas das mesmas causas. Os decisores políticos estão unidos na convicção de que estas tendências são consequência de uma intervenção mais precoce e do melhor tratamento que a despenalização possibilitou.

Do mesmo modo, agora que o fantasma da despenalização foi eliminado, quase todos os políticos portugueses, independentemente da sua corrente política, são unânimes no apoio a esta medida. Infelizmente o mesmo não se pode dizer dos políticos de outros países, em especial daqueles que mais precisam de dar ouvidos a Lisboa.
Glenn Greenwald salienta que o Gabinete para a Política Nacional sobre Droga americano - o czar da droga - tem mantido um silêncio pouco habitual acerca da experiência portuguesa, o que não é de espantar, porque os guerreiros da droga precisam da guerra contra a droga para justificarem a sua existência.
Não deixa de ser um sinal de esperança, todavia, que alguns políticos americanos corajosos tenham sugerido que os Estados Unidos precisam de repensar a fundo a sua abordagem ao problema das drogas ilícitas. O mesmo não se pode dizer do Canadá, que é praticamente o único país ocidental ainda a favor do aumento da penalização.

Estando à vista as provas a favor da despenalização, os políticos não deveriam ser autorizados a arrebanhar apoios para a penalização, fomentando na população o medo de um fantasma que não existe.

( tradução para o português deste original dO jornal de referência do Canadá feito pela revista de Junho COURRIER INTERNACIONAL ).

Em caixa o articulista escreve ainda o seguinte:

«A TIME também destacou o relatório do Instituto Cato.

Na edição de 26 de Abril, a revista nova-iorquina lembra que a despenalização, em 2001, gerou receios de que Portugal se tornasse um destino do «turismo da droga».

Esses revelaram-se injustificados, pois o consumo desceu e há mais toxicodependentes a tentar tratar-se. À proporção, há mais gente nos Estados Unidos a consumir cocaína do que portugueses a usar marijuana.

Mark Kleiman, académico que estuda o fenómeno da droga, recomenda aos legisladores americanos que apreciem a experiência Lusa, embora pense que não pode ser transposta directamente para os Estados Unidos, devido às diferenças de dimensão dos estados.

Sem comentários:

Enviar um comentário