A agência de notação de risco Standard & Poor’s (S&P), ao mais alto nível, pela boca do seu diretor John Chambers, repetiu na semana passada que o país mais poderoso do mundo poderá ir diretamente para “D” (de default) na notação de risco, se falhar o pagamento de títulos do Tesouro de curto prazo na ordem dos 30 mil milhões de dólares que vencem a 4 de agosto. Em virtude da incerteza, a S&P reviu a perspetiva de notação do risco da dívida dos Estados Unidos – que atualmente é de AAA, a nota mais elevada – para negativa e admitiu que há uma probabilidade de 30% de baixar essa notação nos próximos dois anos.
A dúvida sobre se ocorrerá um incumprimento, mesmo que “por uns dias”, na América deriva do impasse em que continuam as negociações entre Democratas e Republicanos sobre o aumento do teto de endividamento federal. Espera-se um esforço de entendimento entre 15 e 22 de julho.
Washington pede emprestado 40% do que gasta
O limite orçamental federal para o endividamento atingiu o teto de 14,3 biliões de dólares a 16 de maio, um valor que equivale a 93% do Produto Interno Bruto americano estimado para 2011. O secretário do Tesouro de Obama, Timothy Geithner, passou a usar algumas medidas extraordinárias para manter o serviço de dívida desde essa data, mas avisou que em agosto não tinha mais alternativas.
A aritmética é simples: o governo federal por cada dólar que gasta pede emprestados 40 cêntimos. Por isso, o secretário do Tesouro foi muito claro: se não houver aumento do teto de endividamento, Washington terá de cortar 40% na despesa. Argumentou ainda que a ideia de “dar prioridade” nos pagamentos, sugerida por congressistas republicanos, é “irresponsável” e que jamais ocorreu na história americana. Em virtude desta situação, a Bloomberg avançou que Geithner poderá vir a pedir a demissão.
De facto, a palavra default subiu em junho pela primeira vez explicitamente ao palco político nos Estados Unidos e passou a ser tema de conversa no mundo. A crise da dívida soberana, depois de ter ganho o primeiro plano na “periferia” da zona euro, ameaça, agora, meter o pé na vida americana e ao entrar neste baluarte é toda a economia mundial que pode entrar em convulsão.
Brincar com o fogo
Dois responsáveis chineses advertiram que os parlamentares americanos que se opõem ao aumento do teto de endividamento estão “a brincar com o fogo”. Li Daokui, do Banco Central da China, afirmou que havia o risco real de um default da dívida americana, no que foi acompanhado por Yuan Gangming, da Academia de Ciências Sociais da China. O presidente da agência de rating chinesa Dagong disse claramente que “na opinião da agência, os Estados Unidos têm estado, de facto, a provocar um default da sua dívida”. A Dagong foi a primeira agência a baixar a notação dos Estados Unidos para AA e do Reino Unido para AA-, retirando os dois países do triplo A, a notação máxima, de total segurança.
Para além da China, logo o Banco Central da Índia reagiu e o príncipe multimilionário Al-Walled, da família real saudita, veio falar da “bomba da dívida americana”
O próprio Fundo Monetário Internacional alertou na semana passada para o risco de default nos Estados Unidos. O fundo escreveu preto no branco que os congressistas americanos deverão entender-se sobre o tema para evitar “um severo choque na economia mundial e no sistema financeiro internacional”, palavras que a agência chinesa de notícias Xinhua sublinhou.
Segundo a Reuters, alguns congressistas republicanos “pensam que um default técnico [no princípio de agosto] poderá ser o preço a pagar para que a Casa Branca aceite cortar na despesa” e imaginam que os credores aceitariam “um pequeno atraso, talvez uns dias” até que consigam fazer ajoelhar Obama. O novo ano fiscal inicia-se a 1 de outubro, pelo que esta guerrilha não vai parar tão cedo. E com um ingrediente adicional, o facto de 2012 ser ano de eleições presidenciais.
Posteriormente, André Colquhoun, responsável asiático da Fitch, disse em Singapura que o rating dos Estados Unidos será colocado em perspetiva de revisão negativa se o Congresso norte-americano prosseguir nas guerrilhas políticas e não aumentar o nível do teto de endividamento federal até princípio de agosto. Acrescentou ainda mais claramente que se o Tesouro americano falhar o segundo pagamento de dívida a 15 de agosto, então a Ficth baixará o rating dos Estados Unidos para “default restrito”.
Agitação nos credit default swaps da dívida
O historiador Niall Ferguson estimou que o esforço de correção orçamental na América exigirá um corte de 12,8% do PIB, mais ou menos o que vai ser necessário no Reino Unido e no Japão quando o sino tocar a rebate, mas muito mais do que o esforço na Grécia, Itália, Espanha ou Portugal, os países da zona euro que têm estado em foco.
Em virtude deste contexto estrutural referido por Ferguson, tem aumentado o interesse por segurar contra o risco de um incumprimento da dívida americana no mercado dos credit default swaps (cds no acrónimo). Os Estados Unidos foram o país que, nos últimos doze meses, registou o maior aumento do valor líquido (net notional value) nos cds, mais de 136%, ainda que esse valor seja ainda baixo na ordem dos 4,5 mil milhões de dólares, menos do que para Portugal ou a Grécia, segundo um estudo publicado no blogue ZeroHedge.
Também o spread para os cds a 5 anos da dívida americana foi dos que mais aumentou no mundo no segundo trimestre deste ano – os Estados Unidos estão no grupo dos 10 países com maiores subidas desses spreads, segundo o relatório da Markit sobre o comportamento das dívidas soberanas no segundo trimestre, que concluiu que o “medo de um default técnico [nos EUA] disparou”. Este spread dos cds a 5 anos representa o custo de segurar contra um default 1 milhão de dólares da dívida de cada país. O spread no caso americano aumentou 28% no último trimestre, colocando os Estados Unidos em 9º lugar nessa lista.
A Standard & Poor’s acha que, no último minuto, os congressistas americanos acabarão por se entender sobre o aumento do teto de endividamento, tal como “já aconteceu mais de 70 vezes desde os anos 1960″.
Mas como a política, por vezes, é uma caixinha de surpresas, a incerteza continua a dominar os investidores da dívida soberana americana. E o mundo está, agora, suspenso do que irá ocorrer no outro lado do Atlântico. O fogo da crise grega não está apagado – a turbulência foi adiada para setembro -, mas os olhos estão, agora, na América que comemora hoje o seu dia da Independência.
A dúvida sobre se ocorrerá um incumprimento, mesmo que “por uns dias”, na América deriva do impasse em que continuam as negociações entre Democratas e Republicanos sobre o aumento do teto de endividamento federal. Espera-se um esforço de entendimento entre 15 e 22 de julho.
Washington pede emprestado 40% do que gasta
O limite orçamental federal para o endividamento atingiu o teto de 14,3 biliões de dólares a 16 de maio, um valor que equivale a 93% do Produto Interno Bruto americano estimado para 2011. O secretário do Tesouro de Obama, Timothy Geithner, passou a usar algumas medidas extraordinárias para manter o serviço de dívida desde essa data, mas avisou que em agosto não tinha mais alternativas.
A aritmética é simples: o governo federal por cada dólar que gasta pede emprestados 40 cêntimos. Por isso, o secretário do Tesouro foi muito claro: se não houver aumento do teto de endividamento, Washington terá de cortar 40% na despesa. Argumentou ainda que a ideia de “dar prioridade” nos pagamentos, sugerida por congressistas republicanos, é “irresponsável” e que jamais ocorreu na história americana. Em virtude desta situação, a Bloomberg avançou que Geithner poderá vir a pedir a demissão.
De facto, a palavra default subiu em junho pela primeira vez explicitamente ao palco político nos Estados Unidos e passou a ser tema de conversa no mundo. A crise da dívida soberana, depois de ter ganho o primeiro plano na “periferia” da zona euro, ameaça, agora, meter o pé na vida americana e ao entrar neste baluarte é toda a economia mundial que pode entrar em convulsão.
Brincar com o fogo
Dois responsáveis chineses advertiram que os parlamentares americanos que se opõem ao aumento do teto de endividamento estão “a brincar com o fogo”. Li Daokui, do Banco Central da China, afirmou que havia o risco real de um default da dívida americana, no que foi acompanhado por Yuan Gangming, da Academia de Ciências Sociais da China. O presidente da agência de rating chinesa Dagong disse claramente que “na opinião da agência, os Estados Unidos têm estado, de facto, a provocar um default da sua dívida”. A Dagong foi a primeira agência a baixar a notação dos Estados Unidos para AA e do Reino Unido para AA-, retirando os dois países do triplo A, a notação máxima, de total segurança.
Para além da China, logo o Banco Central da Índia reagiu e o príncipe multimilionário Al-Walled, da família real saudita, veio falar da “bomba da dívida americana”
O próprio Fundo Monetário Internacional alertou na semana passada para o risco de default nos Estados Unidos. O fundo escreveu preto no branco que os congressistas americanos deverão entender-se sobre o tema para evitar “um severo choque na economia mundial e no sistema financeiro internacional”, palavras que a agência chinesa de notícias Xinhua sublinhou.
Segundo a Reuters, alguns congressistas republicanos “pensam que um default técnico [no princípio de agosto] poderá ser o preço a pagar para que a Casa Branca aceite cortar na despesa” e imaginam que os credores aceitariam “um pequeno atraso, talvez uns dias” até que consigam fazer ajoelhar Obama. O novo ano fiscal inicia-se a 1 de outubro, pelo que esta guerrilha não vai parar tão cedo. E com um ingrediente adicional, o facto de 2012 ser ano de eleições presidenciais.
Posteriormente, André Colquhoun, responsável asiático da Fitch, disse em Singapura que o rating dos Estados Unidos será colocado em perspetiva de revisão negativa se o Congresso norte-americano prosseguir nas guerrilhas políticas e não aumentar o nível do teto de endividamento federal até princípio de agosto. Acrescentou ainda mais claramente que se o Tesouro americano falhar o segundo pagamento de dívida a 15 de agosto, então a Ficth baixará o rating dos Estados Unidos para “default restrito”.
Agitação nos credit default swaps da dívida
O historiador Niall Ferguson estimou que o esforço de correção orçamental na América exigirá um corte de 12,8% do PIB, mais ou menos o que vai ser necessário no Reino Unido e no Japão quando o sino tocar a rebate, mas muito mais do que o esforço na Grécia, Itália, Espanha ou Portugal, os países da zona euro que têm estado em foco.
Em virtude deste contexto estrutural referido por Ferguson, tem aumentado o interesse por segurar contra o risco de um incumprimento da dívida americana no mercado dos credit default swaps (cds no acrónimo). Os Estados Unidos foram o país que, nos últimos doze meses, registou o maior aumento do valor líquido (net notional value) nos cds, mais de 136%, ainda que esse valor seja ainda baixo na ordem dos 4,5 mil milhões de dólares, menos do que para Portugal ou a Grécia, segundo um estudo publicado no blogue ZeroHedge.
Também o spread para os cds a 5 anos da dívida americana foi dos que mais aumentou no mundo no segundo trimestre deste ano – os Estados Unidos estão no grupo dos 10 países com maiores subidas desses spreads, segundo o relatório da Markit sobre o comportamento das dívidas soberanas no segundo trimestre, que concluiu que o “medo de um default técnico [nos EUA] disparou”. Este spread dos cds a 5 anos representa o custo de segurar contra um default 1 milhão de dólares da dívida de cada país. O spread no caso americano aumentou 28% no último trimestre, colocando os Estados Unidos em 9º lugar nessa lista.
A Standard & Poor’s acha que, no último minuto, os congressistas americanos acabarão por se entender sobre o aumento do teto de endividamento, tal como “já aconteceu mais de 70 vezes desde os anos 1960″.
Mas como a política, por vezes, é uma caixinha de surpresas, a incerteza continua a dominar os investidores da dívida soberana americana. E o mundo está, agora, suspenso do que irá ocorrer no outro lado do Atlântico. O fogo da crise grega não está apagado – a turbulência foi adiada para setembro -, mas os olhos estão, agora, na América que comemora hoje o seu dia da Independência.
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