Hoje pela manhã aconteceu aqui, em Vila do Conde, uma cerimónia que apanhei por acaso enquanto dava a minha volta de bicicleta: a Câmara inaugurava o Monumento ao Soldado da Guerra do Ultramar.
Uma pequena multidão rodeava as individualidades da praxe e envolvia de um certo tédio os seus discursos, enquanto , como eu, circunvagueava o olhar surpreso pelo encantador e subtil monumento que se espraia por um enorme monstro de ferro que se projecta para o céu como uma árvore que abre à frutificação de algo, como se fosse um resgurdo para a figura do soldado esculpido em tamanho natural que se lhe cola; e, ao lado, por detrás de um muro granítico, a figura sentada pelo peso da saudade, uma mulher caxineira de medalhão com a fotografia do seu homem-soldado ao peito, lê uma carta que diz:-"a minha alma ficou no cais , adeus até ao meu regresso".
Tudo certo , tudo consoante os previstos, arrumados a um lado um grupo de soldados aprumando a sua G3, do outro as individualidades, o senhor abade muito velhinho e hirto como um inglês e que só podia ser o antigo padre que os viu partir e lhes guardou a memória e a memória do apoio às viúvas, mais afastadas e como que envergonhadas mulheres jovens, sozinhas como a despropósito naquele obelisco de homens e que só podiam ser filhas de qualquer um dos 47 nomes vulgares agora ali inscritos.
Tudo tédio, tudo segundo os conformes. E de repente, de repente, começa a leitura de cada um dos quarenta e sete nomes. Gritado o nome, os soldados em formatura mais umas dezenas de presentes na casa dos sessentas, civis estes, embora com a respeitável boina dos comandos,dos fuzas,dos páras que sempre vão ser, respondiam em coro:-"PRESENTE!",numa voz cuja fragilida sofrida fazia tremer o chão. E repetia , agora o segundo nome da lista escrita no mural, e a terceira, e a quarta, e um exército todo!, todos os exércitos, o mundo português todo!. E a resposta uníssona : PRESENTE!
As lágrimas correram-me cara a baixo. Envergonhado, olhei a medo: à minha volta os olhos turvavam-se, as faces escondiam-se da minha vergonha, também. E eu percebi pela primeira vez o que era o 10 de Junho.
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