O economista-chefe da Deloitte Research em Londres disse ao Expresso que “o Reino Unido é um paradoxo” e que as empresas devem usar a liquidez que tenham para aquisições baratas “como fazem os chineses e indianos”.
Ian Stewart, que está na consultora desde 2007, publica todas as segundas-feiras um “Money Briefing” de referência que vai para mais de 10 mil clientes e colegas. E, no final de cada ano, surpreende os colegas com um questionário de perguntas difíceis – quase todas com rasteiras – para avaliar o conhecimento em temas financeiros e económicos mundiais por parte dos consultores.
Veio, recentemente, a Lisboa à Conferência CFO 2012, organizada pelo INDEG Business School, para apresentar os resultados do último inquérito que a Deloitte realizou em dezembro no Reino Unido aos administradores financeiros das empresas britânicas viradas para o mercado doméstico e para os mercados globais.
Uma mudança enorme
O consultor britânico confessa que “a Alemanha aproveitou a crise para se tornar a potência dominante”. “Foi uma mudança enorme”, acrescenta, salientando que “essa foi a principal consequência desta crise, e teremos de nos adaptar a essa nova situação”.
Admite que a “festa” alemã pode acabar se o país entrar em estagnação. A última revisão conhecida – anunciada hoje – cortou a previsão de crescimento alemão em 2012 de 2,2% para 0,7%, com um contexto europeu em que o crescimento rondará os 0,4%. O Fundo Monetário Internacional ensombrou, entretanto, ainda mais, as previsões ao adiantar que a zona euro poderá contrair-se em 0,5%.
Além disso prevê-se que a dinâmica anual do PIB na China e na Índia abrande para valores abaixo de 8,5% no primeiro país e de 8% no segundo. Refira-se que a China é hoje o principal mercado de crescimento das exportações alemãs e poderá ultrapassar a França como principal destino até ao final deste ano.
No entanto, Ian sublinha que, em termos de competitividade de custos laborais, a Alemanha acumulou uma vantagem ao longo de uma década que coloca a um canto os restantes parceiros europeus. A assimetria é gritante. Os custos laborais aumentaram na Alemanha apenas 5% entre 2000 e 2010, enquanto no Reino Unido e na Irlanda subiram 30%, em Portugal ou Espanha 33%, na Itália 37% e na Grécia 44%.
A dimensão da assimetria entre a Alemanha e o grupo dos países do Clube Med da zona euro pode, ainda, ser medida de outra forma: nos últimos dez anos, Berlim acumulou um excedente de 1,9 biliões de dólares(€1500 mil milhões), enquanto que o défice acumulado de Itália, França, Espanha, Grécia e Portugal foi de 1,5 biliões de dólares (cerca de €1160 mil milhões), segundo um relatório do Bank of America Merryll Linch
A ideia de um euro forte pode estar, também, a esfumar-se se a solução política não surgir. Diz o consultor: “Todas as explicações que têm sido dadas de que o euro é forte apesar da crise da dívida na zona euro podem sofrer um abalo. Prevejo que continue a depreciar-se, particularmente face ao dólar e à libra, se não houver uma solução na zona euro”.
Ian sublinha que, nos resultados do último inquérito realizado, o que mais atormenta os administradores financeiros britânicos é que ocorra um colapso da zona euro – o que preocupa 33% dos respondentes. A probabilidade de que isso aconteça é de 37%, segundo os inquiridos, uma percentagem superior ao que pensam os economistas ouvidos pelo Financial Times (probabilidade de 28%). Há um sinal que parece simbólico: “Quando alguém perguntava ao anterior presidente do Banco Central Europeu se havia algum risco do euro colapsar, Jean-Claude Trichet, no seu tom francês, respondia: absurde (absurdo). Ora, o novo presidente, Mário Draghi, admitiu a questão numa entrevista recente ao Financial Times”. Um detalhe significativo.
O Reino Unido é um paradoxo
Pode parecer paradoxal para os europeus continentais que os britânicos se preocupem com a sorte da zona euro. “O próprio Reino Unido é um paradoxo”, ri-se. “Por um lado, esperamos que o euro tenha sucesso – os bancos ingleses estão muito expostos ao continente. A interligação hoje das economias e dos sistemas financeiros na Europa é imensa. Mas, por outro lado, a situação atual pode colocar em risco o relacionamento do Reino Unido com a União Europeia”, acrescenta.
“Para mim a União Europeia é sobretudo comércio livre e liberdade de movimentos de capital e de trabalho, não uma instituição política. Não creio que o Reino Unido aceite regras de um compacto orçamental, o projeto que está em cima da mesa. De facto, há um problema de longo prazo sobre o que quer o Reino Unido em relação à União Europeia”, refere, ainda, o economista-chefe da Deloitte Research.
No fundo, coloca-se aos britânicos um dilema estratégico. “É inconcebível ser parte dessa integração em curso. O Reino Unido pode ser colocado numa posição em que seja forçado a sair da União”. Na resolução do problema da crise da dívida da zona euro, Ian prefere que seja o Fundo Monetário Internacional a atuar.
Façam como os chineses e os indianos
Quanto às empresas, a mensagem é clara: “Usem a liquidez disponível para procederem a aquisições baratas, tal como fazem os asiáticos, os chineses ou os indianos”. De facto, nos resultados do inquérito, os administradores financeiros vêm oportunidades de crescimento na aquisição de empresas ou de outros ativos a bom preço, bem como explorar as fraquezas da concorrência.
Em termos de estratégia, o economista-chefe da Deloitte Research defende que as empresas devem procurar segmentos de negócio não dependentes do crescimento do Produto Interno Bruto, relativamente protegidas das oscilações dos ciclos económicos.
As prioridades que os administradores financeiros inquiridos pela Deloitte apontam centram-se em seis áreas: reduzir custos, aumentar o cash flow, introduzir novos produtos e serviços ou expandir para novos mercados, reter liquidez nos balanços, proceder a aquisições e fusões ou expandir organicamente (através de criação de emprego, de investimento em capital fixo ou de desenvolvimento dos produtos). “Invistam para o longo prazo”, aconselha, a terminar, Ian Stewart.
Antes de entrar na Deloitte, Ian Stewart foi economista-chefe da Merrill Lynch para a Europa, em Londres. Foi responsável no Partido Conservador pelo Departamento de Investigação e foi economista da Confederação da Indústria Britânica.
Ian Stewart, que está na consultora desde 2007, publica todas as segundas-feiras um “Money Briefing” de referência que vai para mais de 10 mil clientes e colegas. E, no final de cada ano, surpreende os colegas com um questionário de perguntas difíceis – quase todas com rasteiras – para avaliar o conhecimento em temas financeiros e económicos mundiais por parte dos consultores.
Veio, recentemente, a Lisboa à Conferência CFO 2012, organizada pelo INDEG Business School, para apresentar os resultados do último inquérito que a Deloitte realizou em dezembro no Reino Unido aos administradores financeiros das empresas britânicas viradas para o mercado doméstico e para os mercados globais.
Uma mudança enorme
O consultor britânico confessa que “a Alemanha aproveitou a crise para se tornar a potência dominante”. “Foi uma mudança enorme”, acrescenta, salientando que “essa foi a principal consequência desta crise, e teremos de nos adaptar a essa nova situação”.
Admite que a “festa” alemã pode acabar se o país entrar em estagnação. A última revisão conhecida – anunciada hoje – cortou a previsão de crescimento alemão em 2012 de 2,2% para 0,7%, com um contexto europeu em que o crescimento rondará os 0,4%. O Fundo Monetário Internacional ensombrou, entretanto, ainda mais, as previsões ao adiantar que a zona euro poderá contrair-se em 0,5%.
Além disso prevê-se que a dinâmica anual do PIB na China e na Índia abrande para valores abaixo de 8,5% no primeiro país e de 8% no segundo. Refira-se que a China é hoje o principal mercado de crescimento das exportações alemãs e poderá ultrapassar a França como principal destino até ao final deste ano.
No entanto, Ian sublinha que, em termos de competitividade de custos laborais, a Alemanha acumulou uma vantagem ao longo de uma década que coloca a um canto os restantes parceiros europeus. A assimetria é gritante. Os custos laborais aumentaram na Alemanha apenas 5% entre 2000 e 2010, enquanto no Reino Unido e na Irlanda subiram 30%, em Portugal ou Espanha 33%, na Itália 37% e na Grécia 44%.
A dimensão da assimetria entre a Alemanha e o grupo dos países do Clube Med da zona euro pode, ainda, ser medida de outra forma: nos últimos dez anos, Berlim acumulou um excedente de 1,9 biliões de dólares(€1500 mil milhões), enquanto que o défice acumulado de Itália, França, Espanha, Grécia e Portugal foi de 1,5 biliões de dólares (cerca de €1160 mil milhões), segundo um relatório do Bank of America Merryll Linch
A ideia de um euro forte pode estar, também, a esfumar-se se a solução política não surgir. Diz o consultor: “Todas as explicações que têm sido dadas de que o euro é forte apesar da crise da dívida na zona euro podem sofrer um abalo. Prevejo que continue a depreciar-se, particularmente face ao dólar e à libra, se não houver uma solução na zona euro”.
Ian sublinha que, nos resultados do último inquérito realizado, o que mais atormenta os administradores financeiros britânicos é que ocorra um colapso da zona euro – o que preocupa 33% dos respondentes. A probabilidade de que isso aconteça é de 37%, segundo os inquiridos, uma percentagem superior ao que pensam os economistas ouvidos pelo Financial Times (probabilidade de 28%). Há um sinal que parece simbólico: “Quando alguém perguntava ao anterior presidente do Banco Central Europeu se havia algum risco do euro colapsar, Jean-Claude Trichet, no seu tom francês, respondia: absurde (absurdo). Ora, o novo presidente, Mário Draghi, admitiu a questão numa entrevista recente ao Financial Times”. Um detalhe significativo.
O Reino Unido é um paradoxo
Pode parecer paradoxal para os europeus continentais que os britânicos se preocupem com a sorte da zona euro. “O próprio Reino Unido é um paradoxo”, ri-se. “Por um lado, esperamos que o euro tenha sucesso – os bancos ingleses estão muito expostos ao continente. A interligação hoje das economias e dos sistemas financeiros na Europa é imensa. Mas, por outro lado, a situação atual pode colocar em risco o relacionamento do Reino Unido com a União Europeia”, acrescenta.
“Para mim a União Europeia é sobretudo comércio livre e liberdade de movimentos de capital e de trabalho, não uma instituição política. Não creio que o Reino Unido aceite regras de um compacto orçamental, o projeto que está em cima da mesa. De facto, há um problema de longo prazo sobre o que quer o Reino Unido em relação à União Europeia”, refere, ainda, o economista-chefe da Deloitte Research.
No fundo, coloca-se aos britânicos um dilema estratégico. “É inconcebível ser parte dessa integração em curso. O Reino Unido pode ser colocado numa posição em que seja forçado a sair da União”. Na resolução do problema da crise da dívida da zona euro, Ian prefere que seja o Fundo Monetário Internacional a atuar.
Façam como os chineses e os indianos
Quanto às empresas, a mensagem é clara: “Usem a liquidez disponível para procederem a aquisições baratas, tal como fazem os asiáticos, os chineses ou os indianos”. De facto, nos resultados do inquérito, os administradores financeiros vêm oportunidades de crescimento na aquisição de empresas ou de outros ativos a bom preço, bem como explorar as fraquezas da concorrência.
Em termos de estratégia, o economista-chefe da Deloitte Research defende que as empresas devem procurar segmentos de negócio não dependentes do crescimento do Produto Interno Bruto, relativamente protegidas das oscilações dos ciclos económicos.
As prioridades que os administradores financeiros inquiridos pela Deloitte apontam centram-se em seis áreas: reduzir custos, aumentar o cash flow, introduzir novos produtos e serviços ou expandir para novos mercados, reter liquidez nos balanços, proceder a aquisições e fusões ou expandir organicamente (através de criação de emprego, de investimento em capital fixo ou de desenvolvimento dos produtos). “Invistam para o longo prazo”, aconselha, a terminar, Ian Stewart.
Antes de entrar na Deloitte, Ian Stewart foi economista-chefe da Merrill Lynch para a Europa, em Londres. Foi responsável no Partido Conservador pelo Departamento de Investigação e foi economista da Confederação da Indústria Britânica.
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