terça-feira, 30 de março de 2010

BOOMERANG II

Há muitos anos, andava eu a escrever um diário a que chamei " Fazer Com Que Os Dias Contem", escrevi um texto sobre o chico-espertismo português que todos os dias via no consultório, com o  espanto por ninguém parecer perceber que o sufixo ismo significa o absoluto da coisa ( por exemplo, "economicismo", expressão tão em voga, significa que a econonia é vista como um valor absoluto que se justifica e auto-justifica ; ou que os ismos do salazarismo, franquismo, fascismo, estalinismo, comunismo, capitalismo,ou nazismo, são auto-justificáveis por terem sido entendidos como valores absolutos, apesar de darem no que deram).
E, resultou, das experiências dos meus doentes, o meu entendimento de que não compreendiam que um simples gesto seu junto do conjuge era um ab início e nunca um finis terra do que quer que fosse; ou seja, tudo o que fazíamos tinha consequências que, sem excepção, regressavam para, como uma onda ou um tsunami que ganhara força com o tempo, nos destruir.

Do que na altura escrevi, lembro-me da história de um paciente que era mais ou menos assim:

O senhor Ferreira, meu doente, chefe de vendas, é chamado ao director comercial da sua empresa para lhe dar um balanço das contas e respectivas expectativas de vendas.
O senhor Romero, seu director, fica feliz pela perspectiva de mostrar ao seu admininistrador directo a sua capacidade, a sua perspicácia, a sua autoridade no trabalho, e após uma semana de noites perdidas  a trabalhar nele, entrega ao seu superior um relatório a cores, muito bem batido em computador, e com gráficos de barras coloridos. O administrador diz-lhe que o deixe ficar que depois o analiza, e o senhor Romero sai a ruminar com um futuro aumento e uma promoção, feliz como um cuco. Mas, no dia seguinte, o administrador reporta ao presidente da administração os dados recolhidos, e este, com um gesto brusco e agreste, atira-lhe o relatório para as mãos dizendo:
- "Refaça-me tudo de novo. Isto é uma merda que não vale nada!".
O senhor Romero, em consequência, recebe de volta, na  secretária do chefe, o documento, e com ele na mão sai polidamente mas prestes a explodir interiormente. Se ele tivesse uma secretária teria descarregado nela a sua raiva dizendo-lhe:-" dormiu mal?, já reparou no seu ar e como se apresenta nesta empresa?, quando é que se apresenta como deve ser?". Mas sem secretária, o senhor Romero guarda consigo a raiva que vai crescendo com as horas de trabalho, de modo que quando chega a casa e dá de caras com a mulher que lhe prepara, cheia de cuidados e ternura o  seu petisco preferido, esperando-o com um sorriso largo e alma aberta, ELE ROSNA:
-"Outra vez perdiz de caça com paté!?".
A senhora Romero, lágrimas a soltarem-se-lhe dos olhos, o coração apertado e um terrível nó na garganta serve o jantar num silêncio de chumbo. O pequeno Romero júnior abre a boca para fazer uma pergunta inocente que é recebida com um CALA-TE, gritado pela mãe. A refilar por tudo e por nada, a criança acaba mais cedo o seu jantar sem comer a banana já descascada. Se ele pudesse agarraria a cauda do gato até que o bicho esperneasse. Mas como não tem gato, mete-se na cama a rogar pragas e a magicar que o tempo corre lento para ele poder abandonar aquela casa de doidos. Na manhã seguinte acorda tão furioso que só faz tropelias na escola.Tais tropelias, que a sua professora se passa dos carretos contra ele, numa fúria que cresce com o tempo em que decorre a aula.
E, quando chega a casa, a professora, mal o marido entra para almoçar, invectiva-o com os mais ignominiosos insultos porque não secara completamente os sapatos no tapete que ela mesmo nesse dia não pusera à porta.
O marido não era outro que o administrador da empresa do senhor Romero!

Vem tudo isto a propósito do que antes escrevi sobre o chico-espertismo lusitano, pecado mortal que me atrevo a acrescentar aos cinco já aqui descritos em outros "posts".
Os portugueses mostram ter um tropismo pelo abismo , assim como se o risco de estar próximo do abismo nos desse o prazer dum orgasmo ( como diria o maior avançado de sempre do futebol portugês, o portista Fernando Gomes ). E, se para sentir tal prazer, tiverem de ganhar a qualquer preço, roubar, escravizar os subordinados ou "furar" as leis cívicas por um lado, independentemente de saberem que o céu lhes vai cair na cabeça e vão ter de pagar por isso mais tarde, mesmo muito mais  caro..., estão geralmente prontos!. É isto o chico-espertismo - esse ismo que tudo absolutisa -, esse bicho verde e viscoso, que nos mata!

E a propósito Delenda China e Madeira est!


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