A história do vocábulo paranoia abrange as vissicitudes simultâneas e às vezes divergentes de uma palavra de fortuna incerta , por um lado, e por outra de especialização de fenemenologia psiquiátrica analítica dos estados delirantes.
Quanto ao termo paranoia, cujo sentido geral primitivo se referia às alterações psiquiátricas do pensamento, era para a escola alemã - a mais forte do mundo psiquiátrico - sinónimo de doença mental, para além dos transtornos da inteligência ( e.g. atraso mental ) ou da afectividade (e.g. psicose maníaco-depressiva).
Depois de Sander, Schele, Morselli, Buccola e outros, Kraepelin, o famoso psiquiatra, limitou definitivamente a paranoia aos delírios crónicos caracterizados por: a) desenvolvimento lento e insidioso, por influência de causas endógenas de um sistema delirante, inamovível, e insusceptível à argumentação lógica; b) este delírio acompanha-se ( e isto diferencia-o da generalidade dos delírios crónicos ), da conservação plena da claridade de consciência ( e.g. sabe muito bem quem é e onde está ) e de ordem lógica do pensamento ( mas a partir de pressupostos grosseiramente falsos ), bem como da conservação da capacide volitiva ( da vontade própria ) e da acção ( capacidade de agir ).
Kraepelin vai mais longe, e estabelece uma "constituição" ( biotipologia ) do paranóico:
A sobre-estima do Eu ( geralmente sob a forma de um orgulho e uma vaidade velada, às vezes vestida nos trajos da modéstia, ou do estoicismo ).
Traços evidentes de receio, preludiando ideias de perseguição, geradoras de sentimentos de inquietação e de suspeita.
Daí, tendência para o isolamento e vitimização.
A distorção do pensamento, que depende, por um lado, da preponderância dos valores afectivos ( e. g. lealdade ) sobre os resíduos empíricos ( Dromard ) e que se agrava com um "amor muito estranho à lógica"( Montassut ). Assim, o paranoico justifica todas as suas opiniões , dispondo-se a mover-se no paradoxal até chegar ao absurdo ( a paralógica) com uma obstinação irredutível ( psicorrigidez ) o que predispõe a interpretações delirantes.
A inadapabilidade social é uma quase constante, resultante do que fica antes dito, mais traços de timidez, melancolia, tédio, hipererestesia afectiva.
As psicoses paranoicas agrupam todos os estados delirantes crónicos com múltiplos aspectos clínicos, mas com um tronco comum: sempre um delírio sistemático, logicamente construído sob premissas falsas, com boa adequação ao real e claridade de consciência, com evolução crónica e sem verdadeira demência terminal.
Daí a dificuldade para o comum dos mortais de perceberem que estão frente a um delirante crónico.
São geralmente biotipologicamente asténicos, leptossómicos longilíneos, de cabelo fino, face aguçada e extremidades longas.