A economia mundial vai crescer a médio prazo menos do que registou na década anterior à crise financeira, confirma o ‘World Economic Outlook’ (WEO), o principal documento de previsões e recomendações do Fundo Monetário Internacional (FMI), divulgado esta terça-feira.
A publicação do WEO, bem como do Global Financial Stability Report e do Fiscal Monitor na quarta-feira, antecipam a assembleia anual do FMI e do Banco Mundial entre 7 e 9 de outubro.
O WEO prevê uma taxa de crescimento global de 3,7% entre 2018 e 2021, abaixo da média anual de 4,2% entre 1998 e 2007, mas um pouco acima da média de 3,2% verificada nos últimos oito anos.
O comércio internacional deverá crescer em média 2,9% entre 2008 e 2017 e 4,2% entre 2018 e 2021, bastante distante da média anual de 6,8% da década anterior à crise mundial.
Face a este quadro, o FMI recomenda ação. Dada “a natureza ainda frágil e precária da retoma global e das ameaças que enfrenta”, o WEO sublinha “a necessidade urgente de uma abordagem política abrangente, consistente e coordenada para revigorar o crescimento e torna-lo durável e garantir que seja distribuído de uma forma mais uniforme”.
“O conjunto pode ser maior do que a soma das suas partes, se se usar concertadamente as políticas monetária, orçamental e estrutural – dentro de cada país, de um modo consistente no tempo, e entre países”, referiu Maurice Obstfeld, economista-chefe do Fundo e responsável pelo WEO, na apresentação do documento esta terça-feira.
CONTRA AS POLÍTICAS MÍOPES
Por isso, o Fundo destaca, este ano, expressões como “utilizar todos as alavancas de política”, referindo-se a uma tripla estratégia articulada (monetária, orçamental e de reformas estruturais), “fomentar a cooperação global”, “coordenação intranacional e internacional”, e “esforço multilateral” particularmente em relação a países com espaço de manobra limitado e perspetivas de crescimento muito fraco.
“Muitas oportunidades significativas de impulsionar emprego e rendimentos à volta do mundo estão a ser perdidas hoje em virtude de abordagens políticas míopes”, diz o FMI.
Na conferência de imprensa após a divulgação do documento que dirigiu, o economista-chefe do FMI incitou os países com espaço orçamental a investirem em projetos de infraestruturas de envergadura e a agirem multitalteralmente, com ações simultâneas em diversas frentes.
Respondendo a uma pergunta sobre o impacto de uma vitória do candidato Donald Trump nas eleições de 8 de novembro no EUA, Obstfeld respondeu com pinças: “Tem havido muita discussão nas eleições [presidenciais] sobre mudanças, o que pode ser dramático, especialmente na posição de longa data dos EUA sobre a política comercial. Penso que isso introduz um elemento de incerteza na combinação [de políticas]. Como se sabe, incerteza não é boa para os investidores e para o emprego. Por isso, vamos ver como isso se desenvolve daqui para frente. É muito difícil saber o que realmente irá acontecer depois da eleição, tendo em conta os vários pesos e contrapesos dentro do governo dos EUA”.
A preocupação com a má distribuição dos benefícios da globalização surge, também, em destaque no WEO deste ano. A perceção da desigualdade, e da sua ampliação, tem fortalecido o crescimento de “forças políticas centrífugas” e o aumento da atração pela retórica (visível na Europa e nas eleições presidenciais nos Estados Unidos) e mesmo por medidas protecionistas contra o comércio internacional, avisa o FMI. A globalização está em risco.
Obstfeld disse na conferência de imprensa que “nos países desenvolvidos não se deu grande atenção aos que perderam com o comércio internacional”.
AÇÃO DOS BANCOS CENTRAIS NÃO CHEGA
A relação entre a política monetária, prosseguida pelos bancos centrais, e a política orçamental e económica a cargo dos governos tem sido um ponto de polémica.
O FMI recorda o que tem dito: “A política monetária só por si não será suficiente para eliminar os hiatos do produto e conseguir-se um crescimento equilibrado e sustentável. Uma política orçamental amiga do crescimento é, por isso, essencial, calibrada em função do espaço disponível em cada país”, refere o documento.
Na Zona Euro é particularmente importante “suplementar” a ação do Banco Central Europeu (BCE), chamou à atenção o economista-chefe do Fundo. “Se o BCE mantém o seu mandato de atingir a meta de cerca de 2% de inflação, isso é muito difícil de alcançar sem uma inflação mais alta em alguns dos países que têm hiatos do produto pequenos ou que não os têm. Isso vai exigir mais em termos de um impulso à procura nesses países”, sublinhou. A observação foi feita em resposta a uma pergunta que indagava se a Alemanha e a Holanda eram destinatárias da recomendação do FMI.
Obstfeld crescenta, ainda, a atuação na correção dos balanços dos bancos e das empresas, um uso mais proactivo das políticas macroprudênciais, e a implementação de reformas estruturais.